quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Pump it up!


Olha, já que ultimamente te tenho pegado na mão, reparei, tens as mãos ásperas. Não por cima, mas na palma, tá a precisar de creme.
Foi como pisar um pico, doeu-me logo. Doeu-me o tom de censura, não o reparo, não o facto. Lavo muito as mãos, atalhei seca. Fazes muita lida. Faço. E lavo muito as mãos entre o que faço e entre o tira e põe a luva de borracha. Recolhi a mão, Não quero que te arranhes... Não reagiu particularmente e continuou sabe... a menina é muito formiguinha, muito Cinderela (devia querer dizer Gata borralheira mas enfim), devia arranjar quem lhe fizesse as coisas em casa e dar a roupa a passar, é barato, por 30 ou 40 euros passam-lhe a roupa de dois meses. Foi nesta altura que me deu vontade de rir, dizer desce à Terra. Mas não. Encontrámo-nos para almoçar, para me distrair, desanuviar, mais nada. Tenho realmente mais que fazer e, educar para a realidade, apetece-me fazê-lo quando se trata das minhas filhas. Apenas lhe sorri, chutei da irritação o que consegui, dei-lhe o braço que é macio e ainda está bonito, dourado do sol dos meus dias de cigarra e disse: que tal acompanhar a menina até ali acima? A Gata Borralheira foi convidada para uma vernissage amanhã, vai ter de ir de sapatos, vai comprar uns. Subimos. A foto não faz justiça. São giríssimos, assentam que nem uma luva e têm tudo a ver comigo. Quem é mulher entende, um parzito de sapatos acalma. Ou não. À despedida deitei-lhe O trabalho não faz as pessoas piores, sabe? Não, não faz. Faz só as mãos piores, disse-me a rir, satisfeito com a graçola. Ah!... E onde é a vernissage? Cascais. E vai sózinha? Não. Deve ir gira, e eu que não vou vê-la... Pois é, não vai ver, que pena...

E eu, que acho que o que nos distingue é o carácter que revelamos e não os carats que possuímos, dei o meu tempo por mal empregue, a menos da descoberta do belo par de pumps que me ofertei.
É que há dias em que pessoas de bom senso descarrilam e se portam como se não tivessem dois dedos de testa. E irrita-me que amigos meus, pessoas de que gosto tanto, tenham saídas destas. Fúteis e insensíveis.
Ou tenho razão, ou ando hipersensível, ou passa-se outra coisa qualquer.

3 comentários:

Alexandra disse...

Não tenho deixado aqui marcas de leitura, por falta de tempo. Digo eu. Estás num crescendo de muito de bom. Ando regalada contigo... Queres mais?

edu disse...

Quanto a mim, tens razão...Desde quando é que as indeléveis marcas do trabalho são razão para censura? Como se o trabalho rotineiro, doméstico, ou mesmo o mais pesado, passasse a ser uma instituição de uma classe subjugada aos caprichos e à tendenciosa high life de quem mais não faz que preocuprar-se com cremes que disfarcem a insensatez das próprias vidas e de ter dois ou três dessa "classe infame" por sua conta, que lhes passem a roupa a troco de desdenhosos 30 ou 40 euros.

Mutante disse...

Felizmente, por cá, 30 ou 40 euros não chegam para passar a roupa de dois meses de uma casa de família. Ao contrário do que se passa na Índia onde, por 35 cêntimos, se manda lavar, secar e passar a ferro um vestido.